Nascer mulher, pobre, num
país de terceiro mundo é dose tripla. E se for no nordeste brasileiro, aí é
overdose, crucificação. Tive a oportunidade de conhecer , de perto, a realidade
do sertão do Piauí e parte do sertão Pernambucano. Ali o sofrimento é geral.
Homens, crianças, animais, vegetação.
Tudo. Mas, as mulheres... estas são de
doer o coração. Além de suportarem suas próprias dores, têm que amparar as dores
dos filhos, do marido, dos pais, dos irmãos. São elas o esteio onde todos se
apoiam. Cuidam da casa (se é que se pode chamar de casa o lugar onde moram),
dos filhos, sem terem o que oferecer. Em condições precárias dormem no chão, em
redes, esteiras feitas de folhas de palmeira. Passam, muitas vezes, dias, sem
terem o que comer. Trabalham em serviços pesados, sem nenhuma proteção e ainda
são exploradas por patrões e submetidas a trabalho escravo. Eu vi mulheres que
andavam quilômetros, levando criança no colo, para irem, ao lugarejo mais próximo, vender
uma única abóbora, uma única melancia. Vi uma mulher que tinha apenas um
vestido. Para lavá-lo, ela ficava presa no quarto e o colocava na janela para
secar. Assistem a morte dos filhos, que
adoecem sem terem nenhuma assistência
médica. Lá assisti a um episódio que nunca mais esqueci. Uma mulher, chegou ao lugarejo, depois de andar mais de
seis quilômetros, sob um sol escaldante, descalça, levando uma criança, com
sintomas de gastroenterite, desidratada e muito fraca. No lugarejo havia um único
médico, que era pago pelo Governo do Estado. Chegando ao posto de saúde, que
era mal equipado, sem as mínimas condições para atendimento, o médico se negou
a atender a criança, ao argumento de que só atendia dez casos por dia e o
número já havia se esgotado. Parece mentira, mas não é. Pensei...como pode, um profissional, pago com
o dinheiro do povo, num local onde não há outro médico, não se condoer com esta
situação? Tamanha insensibilidade, falta de compaixão, de profissionalismo. De
tudo. Revoltante. Gostaria de nunca ter visto um indivíduo como este. Nem quis
saber o seu nome. Sua atitude eu nunca esqueci. Mas... não parou por aí. Propus
pagar a consulta. Ele aceitou. É assim mesmo... o ser humano nunca falha. E o dinheiro...Ah! O dinheiro... Vamos voltar às mulheres do
sertão. Elas muito me impressionaram. A força, a garra e a coragem que se
escondem por trás daquelas aparências frágeis, maltratadas, abandonadas me
serviram de lição e despertaram em mim um profundo sentimento de respeito e
admiração. Nunca mais me esqueci delas. Elas foram a minha inspiração quando participei de um concurso promovido
pela Academia Lafaietense de Letras
e fui escolhida entre os agraciados.
O título da obra foi: MULHERES DA SECA.
Nenhum comentário:
Postar um comentário