quarta-feira, 28 de abril de 2021

 

 

 

 

Era uma vez...

Um Passageiro...

Veio de passagem meteórica. Tão logo chegou, tão logo se foi.

Na realidade não era um passageiro comum. Viajante das estradas.  Era um pássaro. Parecido com tantos outros que povoam a terra. Mas tinha algo diferente. Não pousava em nenhum galho. Era saltitante, de lá pra cá, de cá pra lá. Sempre a observar. Nesta mesma estação, que assim como na rua em que existia um bosque que se chamava solidão, existia uma flor solitária, que há muito já desabrochara. Ao pássaro que a tudo observava, não passou despercebida. E o pássaro, como passageiro que era, assim como veio, tão logo se foi. Não sem antes lhe dizer: Olá! Estou indo, mas voltarei sempre que o tempo me permitir, para fazer visitas. Visitas de beija-flor, prometeu. A flor, até então distraída, perdida em descrenças, percebeu que o pássaro, com voos rasantes, a descobrira. Ajeitou suas pétalas e exalou o perfume que ainda existia. Ouviu a promessa... encantou-se e passou a esperar. Mas, no fundo sabia que, um dia, não  haveria próxima visita. Beija-flores plainam, beijam as flores, mas não deixam marcas. Encantam-se, deleitam-se, sem deixar pegadas.  As flores desabrochadas têm menos tempo. Logo as pétalas vão murchando e, de uma em uma , vão se despencando e colorindo o chão. Despetalada, a flor não será mais vista e não receberá mais visitas. Beija-flores não catam pétalas. Sugam néctares. Beija-flores se orientam pelas flores vivas. Com a flor caída, não saberá mais como encontrá-la.  

                  Maria do Carmo Marinho.

                                 

                                       

 

 

                             

 

 

segunda-feira, 30 de dezembro de 2019

O QUE POSSO QUERER?





                                            
              Tenho olhos que veem,
              Tenho boca que fala,
              Pés que andam,
              Braços que abraçam,
              Ouvidos que ouvem.
              O que mais posso querer?
              Assim já perguntaram...
              Não basta simplesmente a vida?
              Não. Não basta.
              Quero a alegria do querer bem,
              A firmeza da cumplicidade,
              A solidez do respeito...
              A certeza da verdade,
              A paz da confiança...
              Quero isso e muito mais.
              Quero ter a crença,
              A esperança e a fé.

                    Maria do Carmo Marinho

segunda-feira, 31 de dezembro de 2018

MARIAS







                       
                                                                                                                                          31dezembro de 2018. O ano se despede. Lá se vão as últimas horas. Uma chuva miúda nos presenteou durante quase todo o dia. Gosto de chuva, quando penso que ela traz vida, alimentando os rios, os lagos, garantindo o sustento da humanidade. Gosto da chuva que é vida. Mas, também ela, como tudo na vida,  possui dois lados. Guilherme Arantes, em sua belíssima canção “Planeta Água”, muito bem lembra que “gotas de água da chuva, tão tristes são lágrimas na inundação”. E outra canção,  cujo autor eu desconheço, que cantávamos na escola, diz:
“Para mim, a chuva no telhado é cantiga de ninar, mas, o pobre, meu irmão, para ele a chuva fria vai entrando em seu barraco e faz lama pelo chão”. Hoje estou mais introspectiva que de costume. Decidi ficar em casa, comigo, sem buscar alternativas para preencher um vazio que não se preenche com alardes de comemorações. Finda-se um  ano. Começa-se outro. Fim e começo são lados de uma mesma moeda. O fim traz consigo um ponto final. O começo uma interrogação. Porém, em se tratando do tempo em que se concentraram nossos projetos, nossos problemas reais, nossos erros, nossas conquistas, nossas alegrias e tristezas, nossas dúvidas e incertezas, perdas e ganhos e os daqueles que nos cercam, o fim do ano não é o ponto final. Quem dera  fosse mesmo um ponto final! No dia 1º de janeiro, acordamos e “ tudo está no seu lugar, graças a Deus,  graças a Deus, Não devemos esquecer de dizer graças a Deus, Graças a Deus". como canta Benito de Paula . Voltando à minha introspecção, a solidão e o tempo chuvoso aguçaram meus pensamentos e meus sentimentos. Colocaram em confronto as Marias que vivem dentro de mim. A racional,  sensata, que põe a ética em primeiro lugar, que pondera,  que avalia consequências, que pensa em si e nos outros, que busca resultados positivos. Para a Maria Razão, a vida é um desafio constante. Questiona regras que cerceiam e que desconsideram as individualidades, que massificam e colocam as pessoas dentro de um quadrado maniqueísta, com placas indicativas “CERTO”, “ERRADO”, num processo mnemônico condicionante e massificador. Maria Razão vive em batalha constante com a Maria Emoção. A primeira pisa em terra firme porque precisa se sentir livre para transitar sem medo de tropeços, de embaraços, e com o olhar sem nuvens de ocultação. Tem medo de condenação. Não agride a rigidez da sua consciência. A segunda, ah, a segunda... É entusiasmada, calorosa, e se delicia com o prazer de sentir prazer. Prazer de mergulhar numa água fresca e cristalina; prazer de dançar, ah, como é bom  embalar-se numa música lenta ou agitar-se num ritmo frenético! Prazer de ouvir música, a  romântica, que toca o coração, a  transformadora, que  faz pensar; O prazer de me sentir amada e admirada pelos meus filhos, pela minha neta e por pessoas que tive o prazer de conhecer e conviver; Pelo prazer de abraçar. Como é gostoso abraçar! Pelo prazer de contemplar o céu, com suas nuvens sempre em movimento, com suas estrelas brilhantes, com sua lua sempre calma e serena  e com o sol, que aparece com suas cores exuberantes e que desaparece, levando estas cores, não sem antes exibi-las  num espetáculo indescritível, que é o crepúsculo. Prazer de contemplar as árvores, a relva, as flores que desabrocham, mesmo estando sozinhas, sem ninguém para admirá-las; prazer de ver e conviver com pássaros, fornecendo-lhes água e alimento, pássaros que cantam, não se importando se alguém vai ouvir;  prazer de ouvir o canto das cigarras, que, a partir do primeiro solo vão se juntando e formando uma orquestra espetacular de sons, escondidas entre as folhas ou agarradas em algum tronco, sem se importarem com plateia; Prazer de ler, de guardar livros, de conhecer personagens que se apresentam sem máscaras, que escancaram seus sentimentos mais escondidos, porque estão protegidos pelas páginas. Só os descobre que tem o desejo de conhecê-los. Prazer de  escrever, de expressar meus sentimentos, meus questionamentos, minhas inquietações e exorcisar meus demônios. Dentre tantos prazeres o prazer de sentir minhas emoções de mulher, de fêmea; De sentir os prazeres do corpo que devem estar sempre aliados aos prazeres do coração. Prazer do toque, da carícia, do afago. Prazer de amar. Além de todos estes prazeres e outros aqui não falados, a Maria Emoção gosta de viver e expressar bons sentimentos; de criar fantasias de contos de fadas; de amar com amor de filme, sem censura, de emocionar-se com o afeto e a gratidão e comover-se com o sofrimento e a miséria humana. Enquanto a razão aprisiona a emoção liberta. A razão é proibitiva, tem suas razões e não  se permite transigir. É um “NÃO”, sem conta. “Não pode”, “não deve”, “não vá”, “não faça”, “cuidado”! A emoção, por outro lado, é permissiva e inconsequente. “Vá”, “faça”, “seja feliz” “você pode” “você merece”. Razão e emoção. Duas forças imperiosas que habitam dentro de mim e de muitas pessoas que, assim como eu, vivem sufocadas, interferindo negativamente até no processo da respiração. As pessoas vivem se sufocando, procurando adaptar-se a normas anormais castrantes e cerceadoras do direito de viver. O Dr. José Ângelo Gaiarsa, médico psiquiatra, que nasceu em Santo André, no dia 19/08/1920 e faleceu em 16/10/ 2010, e que apresentou, de 1983 a 1993, o quadro "Quebra- cabeça," no programa Dia-a Dia, exibido pela Rede Bandeirantes de Televisão, muito bem expressou sobre esta situação, em seu poema, constante de sua obra " Respiração Angústia e Renascimento." Transcrevo alguns trechos. “... Nós nos negamos o mais fundamental dos direitos – o de viver. Por isso vivemos sufocados-angustiados-infelizes.”... “Porque todos vigiam a todos, para que ninguém faça o que todos gostariam de fazer, o que seria bom que todos fizessem. Amar, cantar e dançar... Minha vingança é fazer o mesmo com você...” Paro. Penso... concluo: que pena! Mas a realidade é esta.  Maria Razão está com a razão.

                                     Maria do Carmo Marinho




quarta-feira, 19 de setembro de 2018

SAUDADE







           

Saudade é um nó que aperta. O peito, o coração. Engasga e faz brotar água escondida numa fonte pequenina, perto dos olhos. Sentir saudades de pessoas que se foram e não mais voltarão, de lugares onde um dia vivi ou conheci é fato tão natural que sequer me dou conta de que acontece todos os dias. São saudades boas. Percebo-me triste quando sinto saudades de mim. Da lembrança dos  sonhos que se acabaram, porque não poderiam mesmo se concretizar; da coragem  para me arriscar e me frustrar; do entusiasmo que, na realidade, era fruto de uma crença naquilo que não existe; da vaidade, que se prendia a detalhes que só tinham importância para mim; da força que me impulsionava   a fazer acontecer o impossível, vencer desafios e me renovar a cada dia; da alegria que me fazia achar graça de coisas sem a menor graça. Ai! Que saudades de mim! Fico sentada, sozinha, com meus pensamentos. O olhar se perde num vazio de imagens que se apagaram e se encontra em outras que relutam em ficar. As folhas verdes das plantas revelam o milagre da vida. Do jarro de rosas cor-de-rosa exala um perfume doce e envolvente. Hoje é domingo. Dia de sentir saudades. De sentir solidão. Talvez isto explique o fato de que tantas pessoas cometam suicídio no domingo. A saudade daquilo que fui e hoje não sou mais me deixa triste. Dizem que o tempo tudo muda, com tudo acaba. Penso que o tempo simplesmente passa. Diversos são os fatores que ao longo do tempo provocam as mudanças, as destruições, transformações, seja no mundo material ou  imaterial. Foram os acontecimentos positivos e negativos que impactaram a minha vida e  me fizeram crescer, aprender/desaprender, evoluir, amadurecer.  Transformaram a minha crença, a minha esperança e destruíram a minha ilusão. Tornaram-me cada vez mais racional. O excesso de razão deixa a vida cinzenta.  Sinto saudades da emoção.

                                       Maria do Carmo Marinho
                         



sábado, 11 de agosto de 2018

COMO É BOM!







 COMO É BOM!                                                     

Este poema foi escrito num momento em que ouvia a música *“C’est si bon”, interpretada pela Orchestra Alfred Hause. Maravilhosa! Vale a pena ouvir. Pensando sobre a fragilidade das relações afetivas  que, muitas vezes, trazem mais desencantos que alegrias,  dores e sofrimentos, e no quanto a natureza está sempre a nos presentear com tanta beleza, pensei: Como é bom amar estas belezas ! Acabei aproveitando o compasso de alguns trechos da música.


                               Não é bom, que se perca de si,
                       Procurando um além,
                       Que não vai conseguir.
                                                          Como é bom, encontrar o amor
                                                          Nas coisas belas que a vida
                                                          Deu de presente a você.
                         As  florestas,
                         Flores a perfumar,
                         Encantando as estrelas
                         Lá do céu a mirar,
                                                            Essa terra, colorida de azul
                                                             Aves a revoar
                                                             E o sol a nascer.
                          O luar, como é bom de se ver!
                          E as cores das borboletas,
                          Que encantam nosso viver.
                               Maria do Carmo Marinho.
                             
*A canção foi composta em 1947, por Henri Betti, com  letra de André Hornez, tendo ainda uma versão em inglês, de Jerry Seelen, que leva o título de I’ts so Good. Foi popularizada por Louis Armstrong, em inglês e por Ives Montand, em francês, sendo interpretada por vários cantores e orquestras. (Fonte Internet).


sábado, 30 de dezembro de 2017

SOU NÚMERO?




                                                            
                                                                                                                                                                           Sou número?                    
Sou numeral?
Por que a distinção?
Às vezes somado,
Dividido, multiplicado.
Subtraído  sempre.
Sou número,
Sou numeral,
Sou palmo,
Légua, metro,
Quilômetro.
Sou litro.
Quantas medidas,
Medindo, dividindo ao meio,
Elevando ao quadrado,
Diminuindo até acabar.
Sou muitas...
Multiplicada em tantas faces,
Facetas...
Diminuída ao grão
De areia, perdido na praia.
Dividida entre o tempo que foi
E o tempo que é.
Sou número?
 Sou numeral?
Que diferença faz?
                                                            Maria do Carmo Marinho




segunda-feira, 18 de setembro de 2017

NÃO SOLTE O REMO






Enquanto não abandonar o barco,
Não solte o remo.
Desça por cachoeiras,
Arrisque-se em águas revoltas,
Em águas mansas, descanse.
Respeite as correntezas,
Acompanhe-as.
Elas te levarão para o outro lado,
Para um lugar que não foi pensado.
Surpresas podem ser surpreendentes.
Mas... não solte o remo
Enquanto não abandonar o barco.

                                           Maria do Carmo Marinho