Às vezes penso que sou a reencarnação da Florbela
Espanca. *(risos...) A dor me dói tanto quanto nela doía. Os momentos de dor são importantes.
A dor nos modifica, nos torna fortes e nos ensina a só dar valor àquilo que
realmente merece.
HOJE
Hoje, meu coração
Já não bate mais.
Bateu muito.
Descompassado... acelerado.
Hoje, não o sinto no peito.
Está quieto, resignado.
De tanto ser machucado
Resolveu,
Aqui no canto, do lado,
Encolher-se tão desolado,
Que nem tocando eu lhe sinto.
Será que morreu?
Pergunto eu, assustada.
Ao que ele responde, magoado:
Não morri.
Estou aqui, no mesmo lugar,
De onde não sairei.
Adormeci, quero paz!
De tanto bater em vão, já cansei.
Maria
do Carmo Marinho
PERGUNTA
Por onde andam os dias,
Que encantados fluíam
Assim tão de repente,
Que ao atinar para o tempo,
Lá fora o sol descaía,
A noite escurecia
E a lua também se abria?
Velhos tempos!
Não tão velhos, foi ontem.
Outros tempos?
Sim, outros tempos.
Quando a fantasia
Contrapunha à realidade,
Que escondia o extremo limite do
humano.
Que escondia sentimentos
Tão mesquinhos.
Sentimentos! De onde vêm?
São naturais? Impostos?
Saudáveis? Doentes?
Sentimentos me confundem,
Desnorteiam.
Ponho-me a perguntar,
Sem resposta.
Com estabelecer limites
Entre a maldade e a insanidade?
Maria
do Carmo Marinho.
DECISÃO
Não te deixarei chorando,
Para que não sobrepujes sobre o meu
amor.
Quero te deixar em calma,
Saindo lentamente,
Como quem assiste ao último ato
Da peça que a vida escreveu.
As peças da vida são reais.
Os personagens também.
Os amores podem ser falsos,
Doentes, alucinados,
Ou verdadeiros.
Assim eu te amei.
Por isso, não te deixarei chorando,
Para que não sobrepujes
Sobre o meu amor.
Maria do Carmo Marinho
POEMA INACABADO
Se vais, de ti não sinto falta.
O tempo, a distância,
São inimigos do amor.
Sinto falta de mim.
Do meu sentimento
Que alimenta minha alma,
Que me faz generosa
E alimenta a minha esperança
De acreditar que o amor transforma.
Ah! Os sentimentos!
Tão nobres, tão mesquinhos...
Não podem mesmo
Ser eternos.
Maria
do Carmo Marinho
I-REALIDADE
Esperei sem esperança...
Porque a esperança é sábia.
Sabe o que pode esperar.
O que tive não foi esperança,
Foi fantasia.
Fantasia tão real,
Que de tão clara a irrealidade
Nem a mim mesma enganava.
Maria do
Carmo Marinho
*Florbela Espanca foi uma poetisa portuguesa, nascida em 1894. Teve uma
vida marcada por muitos sofrimentos que eram traduzidos em sonetos, que falavam
de amor, tristeza, solidão, morte, abandono. Foi precursora do
feminismo em Portugal e uma das
primeiras mulheres a cursar Direito na Universidade de
Lisboa. Teve um fim trágico. Em 1930 não
resistiu à terceira tentativa de suicídio e faleceu. Seus sonetos são de uma
força e sensibilidade ímpares. Merecem
ser lidos.
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